Imagine uma pessoa que, após anos lutando contra a obesidade mórbida, finalmente consegue dar um passo decisivo em busca de saúde e qualidade de vida: realiza uma cirurgia bariátrica e, com muito esforço, perde 30, 40, 50 quilos ou mais. A alegria dessa conquista, porém, vem acompanhada de um novo e inesperado desafio: conviver diariamente com o excesso de pele que cobre o corpo, escondendo os resultados de uma batalha vencida. Assaduras, infecções, dores físicas e o peso psicológico de não se reconhecer no próprio espelho tornam-se uma nova forma de sofrimento.
Neste contexto, as cirurgias reparadoras pós-bariátricas são muito mais do que procedimentos estéticos. Elas representam o fechamento de um ciclo de transformação e a verdadeira reconstrução da autoestima, da mobilidade e do bem-estar. Apesar disso, muitas pessoas se deparam com a negativa dos planos de saúde ao solicitar esses procedimentos, enfrentando mais uma barreira que parece desumanizar suas dores. Este artigo visa esclarecer os aspectos médicos, jurídicos e sociais que envolvem esse tema, mostrando que, por trás de cada processo, há uma vida em busca de recomeço.
1. A NATUREZA MÉDICA DA CIRURGIA REPARADORA
A cirurgia reparadora não é um luxo. Quando indicada após a cirurgia bariátrica, ela se torna uma necessidade clínica. De acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (Tema Repetitivo 1.069), essas cirurgias integram o próprio tratamento da obesidade mórbida. Não são meras questões de vaidade, mas sim de saúde física e mental. Em muitos casos, pacientes não conseguem sequer realizar a higiene básica por conta das dobras de pele, o que gera dor, vergonha e isolamento.
2. IMPACTOS FÍSICOS E EMOCIONAIS: A DOR QUE NÃO SE VÊ
Quem nunca passou por isso talvez não compreenda o peso que é olhar no espelho e ver refletido não a vitória, mas o que restou dela. As sobras de pele são lembranças constantes de um corpo que já não existe, mas cujas marcas insistem em permanecer. Mulheres e homens relatam dificuldades para dormir, caminhar, vestir roupas ou até mesmo se relacionar afetivamente. O sofrimento vai além da pele: ele atinge a alma.
A psicologia tem demonstrado, por meio de laudos clínicos, que muitos pacientes desenvolvem transtornos como depressão, ansiedade, baixa autoestima e até distúrbio dismórfico corporal. É comum ouvirmos frases como “eu emagreci, mas ainda me sinto preso ao corpo antigo”. A cirurgia reparadora, nesse cenário, é um instrumento de cura integral.
3. O AMPARO DA JURISPRUDÊNCIA E A FORÇA DA PALAVRA MÉDICA
A Justiça brasileira tem sido sensível a essas realidades. A Súmula 97 do TJ-SP e o recente julgamento do STJ estabeleceram que a negativa de cobertura por parte dos planos de saúde, quando há indicação médica, é abusiva. Isso reforça o papel do médico assistente como protagonista na avaliação da necessidade do procedimento, e não o plano de saúde. A voz de quem conhece o paciente deve prevalecer sobre diretrizes genéricas que ignoram a singularidade de cada história.
4. DANO MORAL: O SOFRIMENTO QUE MERECE REPARAÇÃO
Negar esse tipo de procedimento não fere apenas o contrato, fere a pessoa. Os tribunais têm reconhecido que a recusa imotivada de cobertura para cirurgias reparadoras representa violação à dignidade humana. Não se trata de mero aborrecimento, mas de impedir alguém de recomeçar sua vida com saúde e confiança. Por isso, indenizações têm sido fixadas como forma de reconhecer esse sofrimento.
5. JUNTA MÉDICA: UM RECURSO POSSÍVEL, MAS NÃO ABSOLUTO
É comum que planos de saúde aleguem que o procedimento é estético. Nesses casos, o STJ autoriza a formação de uma junta médica para dirimir divergências. No entanto, essa medida deve respeitar o direito do paciente, não podendo ser usada para protelar ou negar injustificadamente o tratamento. A opinião do médico assistente, que acompanha a realidade do paciente, deve ser considerada com prioridade.
6. ROL DA ANS: REFERÊNCIA, NÃO BARREIRA
Muitos planos se amparam no argumento de que o procedimento não está no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Mas o STJ e diversos tribunais já decidiram que esse rol é exemplificativo, e não limitativo. Ou seja, a ausência de um procedimento não é motivo suficiente para sua exclusão, especialmente quando há prescrição médica e respaldo técnico.
7. CONTRATO E FUNÇÃO SOCIAL: O DIREITO À SAÚDE ACIMA DA LETRA FRIA
O contrato de plano de saúde deve respeitar princípios como a boa-fé e a função social. Cláusulas que visam restringir direitos essenciais, como o acesso à saúde, são nulas por serem abusivas. O Código de Defesa do Consumidor é claro nesse sentido. O beneficiário do plano de saúde é, antes de tudo, um ser humano, e seu contrato deve ser instrumento de proteção, não de negação de direitos.
8. PERGUNTAS FREQUENTES SOBRE CIRURGIA REPARADORA PÓS-BARIÁTRICA
- A cirurgia reparadora após a bariátrica é considerada estética?
Não. A cirurgia reparadora tem caráter funcional e terapêutico, conforme reconhecido pelo STJ no Tema 1.069. Ela trata complicações como assaduras, infecções, dores, dificuldades de locomoção e problemas emocionais causados pelo excesso de pele.
- O plano de saúde é obrigado a cobrir esse tipo de cirurgia?
Sim. Se houver indicação médica, o plano de saúde deve cobrir a cirurgia reparadora. A negativa de cobertura é considerada abusiva e pode ser contestada judicialmente, com base nas Súmulas 97 e 102 do TJSP e na jurisprudência do STJ.
- Preciso que o procedimento esteja no rol da ANS para ter cobertura?
Não. O rol da ANS é exemplificativo, ou seja, serve como referência mínima. A ausência de um procedimento no rol não impede a cobertura, especialmente quando há indicação médica.
- Quais cirurgias são consideradas reparadoras nesse contexto?
Entre as mais comuns estão:
- Dermolipectomia abdominal (retirada de pele do abdômen)
- Plástica mamária com ou sem prótese
- Lipoaspiração com enxerto de glúteo
- Dermolipectomia de coxas, braços e púbis
- Correção de diástase dos retos abdominais
- Herniorrafia umbilical
Todas essas, quando prescritas para tratar efeitos da bariátrica, são consideradas parte do tratamento da obesidade.
- O que fazer se o plano de saúde negar a cirurgia?
Você pode:
- Solicitar a justificativa por escrito da negativa
- Reunir laudos médicos e psicológicos
- Procurar um advogado especializado ou a Defensoria Pública
- Ingressar com uma ação judicial, que pode incluir pedido de tutela de urgência
- É possível pedir indenização por danos morais?
Sim. A Justiça tem reconhecido o dano moral nos casos em que a negativa de cobertura agrava o sofrimento do paciente.
- A operadora pode exigir que eu passe por junta médica?
Pode, desde que arque com os custos dos profissionais e não atrase indevidamente o procedimento. A junta deve ter caráter técnico e não pode desconsiderar o médico assistente que acompanha o paciente.
- Já fiz a bariátrica há anos. Ainda tenho direito à cirurgia reparadora?
Sim. O tempo decorrido não exclui o direito, desde que os problemas físicos ou psicológicos persistam e estejam documentados. O importante é a atualidade da indicação médica.
CONCLUSÃO
A cirurgia reparadora pós-bariátrica vai muito além da estética. Ela é parte do processo de cura, de reconstrução da identidade e da devolução da dignidade. Negar esse direito é perpetuar o sofrimento de quem já lutou demais. Felizmente, o ordenamento jurídico brasileiro tem evoluído para compreender essa realidade, colocando o ser humano no centro da discussão.
É urgente que os planos de saúde se humanizem, compreendam a complexidade da obesidade e de seus desdobramentos, e passem a enxergar seus beneficiários não como números ou contratos, mas como pessoas em busca de um recomeço.
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